quinta-feira, 17 de setembro de 2009

Três da noite

Eu curso Produção Audiovisual no Campus Tom Jobim da Universidade Estácio de Sá. A cada aula, troca-se de espaço físico. Os alunos desatentos, ou que não desfrutam de uma memória privilegiada, contam com um quadro de horários onde ficam organizados as disciplinas, períodos, professores e o mais importante: o número da sala. Esses fabulosos modelos organizacionais ficam disponíveis a cada andar do Campus.

O que agrava o desconforto é que, quando já têm-se decorado a transição letiva, muda-se o período. E então tudo recomeça, até que se acostume de novo e tudo mude, de novo.

Hoje quando cheguei ao segundo andar – pelo menos isso é semi-fixo – passei olhando para o interior da primeira sala, já que as portas possuem um pedaço feito de vidro, que provavelmente foram pensados para nós, os DD's (desatentos e desprivilegiados). Enquanto buscava reconhecer alguém que fosse da minha turma, um sentimento colossal de carinho invadiu o meu coraçãozinho, fazendo com que cada pedacinho do meu corpo se enfiasse nessa sublime nuvem áurea.

Afastando meus cabelos da orelha, o carinho me segurou pelo rosto e sussurrou-me: leve amor, dê carinho. Saculejando os braços, estampando um sorrisinho com forma de melodia e lançando os cabelos para a esquerda e depois para a direita, dei início a minha dança matinal carinhosa. De súbito, minha mãozinha direita estava na maçaneta da porta com o numeral “201”. As unhas vermelhinhas brilhavam com o esmalte cintilante e meus pézinhos, com o all star branco-encardido, mais pareciam estar envoltos com sapatilhas rosas de balet, tamanho o meu carinho.

Qualquer pessoa bem atenta da sala teria notados meus olhinhos de pavor, enquanto meu corpinho interrompia a aula do professor engravatado. “Bom dia, meus amores”, exclamei, bem alto, da ponta de meus pézinhos. Meus movimentos ritmados, o jogar – para lá e para cá – de meus cabelos e meu sorriso musical encantaram de tal forma os, cerca de quarenta, presentes no espaço que ninguém ousou desviar os olhinhos atentos do meu corpinho encasacado de cinza e vermelho.

Retirei-me, fechando a portinha com aquele meu jeitinho carinhoso, satisfeita pelo amor que acabara de derramar àquelas vidinhas. Saltitei pelo corredor até chegar na próxima entrada: “202”. Repeti magistralmente “Bom dia, meus amores”, por quinze vezes, sem que em nenhuma delas eu perdesse o encanto e brilho da primeira, até chegar ao ápice de minha performance luzidia.

A porta “217”, sem que eu pudesse prever, mesmo no auge de minha interação humana, me reservava peculiares surpresinhas! “Bom dia, meus amores”, exclamei, mergulhando aquelas criaturas no meu caldo de carinho. Enquanto esbanjava a minha melodia sorridente, um rapaz levantou-se, deu dois passos em minha direção, ergueu um dos braços e posicionou outro, como um pombo macho quando quer acasalar, e bradou: “Oh!”. Todos olharam-no.